Meu colar de cinco voltas


Por Baby Godoy Madureira

Nós havíamos nos casado no começo de dezembro. Ambos jovens e cheios de esperança. Havia uma coisa boa dentro em nós: não tínhamos ilusões, pois sendo pobres sabíamos que teríamos que lutar muito pela vida.

Chegara a véspera do Natal, e nós ainda estávamos em casa de minha mãe. Minha mãe fez um lindo bolo, rezamos no Presépio, comemos o bolo, e mais tarde eu e Júlio saímos para dar uma volta pela cidade. Quando voltamos ele disse:

– Não tenho nada para lhe dar como presente de festas, porém toma este fecho de colar, guarde-o como lembrança minha, não é grande coisa, mas espero pro ano dar-lhe a primeira volta do colar.

Os dias se passaram e chegou primeiro do ano, saímos de casa de minha mãe, e fomos fazer a vida num armazém de roça. Esse ano todo levamos uma vida normal, ambos trabalhando sempre, e onze meses depois veio o nosso primeiro filho. Era uma criança tão linda como eu jamais havia visto outra igual.

Estávamos radiantes. Nessa mesma noite, Júlio, como da primeira vez, calmo e sereno, deu-me a primeira volta do colar dizendo:

– Enfiei-a com uma linha bem forte que jamais se partirá. Gostas?

Não sei por que achei aquelas contas tão branquinhas e perfeitas que tinha uma semelhança com meu filhinho. Guardei o já então "meu colar" com muito carinho.

Um ano depois tive meu segundo filho: era uma menina. Não tão bonita como o primeiro, mas era gordinha e rosada e tinha os olhos do pai. Estávamos ficando ricos pois já tínhamos dois filhos. A cena do colar se repetiu; só que desta vez Júlio disse:

– Não consegui achar contas iguais, você não se importa?

De fato, as contas eram redondas e rosadas. E Júlio continuou:

– A linha é a mesma, não se partirá.

E ele amarrou no fecho. As duas voltas, tão diferentes entre si, se harmonizaram perfeitamente. Beijei-o em reconhecimento e beijei o meu colar. Não sei por que imediatamente tive a impressão de estar beijando meus dois filhinhos.

Passou-se mais um ano e eu não ganhei outra volta. Minha filha já estava com três anos quando veio nosso terceiro filho: era um menino grande e bonito, havia nascido maior que os outros, e veio Júlio com a terceira volta do colar. Eu já não tinha mais dúvidas: aquela joia falsa que eu recebia em cada nascimento de um filho simbolizava a verdadeira, que Deus nos mandava.

Como sempre as contas não eram iguais, um pouco maiores que as primeiras, essa volta foi colocada em terceiro lugar. Eu achei o colar muito mais bonito; tinha-se a impressão que a segunda volta de contas rosadas e redondinhas era protegida pelas contas maiores.

A nossa vida continuou, as crianças foram crescendo e passaram-se quatro anos. Veio nosso quarto filho. Foi a pior fase de nossa vida; Júlio estava desempregado e eu trabalhava para ajudar na manutenção da casa. No dia em que nasceu a menina eu não ganhei a volta do colar, pois a situação não permitia, o pouco que conseguíamos ganhar não dava para fantasias.

Seis meses depois, uma tarde eu estava à porta com minha filhinha em meus braços quando Júlio chegou em seu caminho e tomando a criança em seus braços deu-me um pacotinho dizendo:

­– Só hoje posso pagar a minha dívida.

Abri e vi a volta do meu colar, fiquei tão contente que chorei. Disse-me Júlio:

– Não sei quantas voltas ainda lhe darei, porém uma coisa é certa: é a mesma linha, que jamais partirá.

Essa volta era formada por continhas ainda menores que as outras, e rosadas como as do meio. Entramos, fui ao quarto e trouxe o colar, Júlio amarrou a quarta volta e meu colar ficou maravilhoso.

Criávamos nossos filhos fazendo-os compreender que uma coisa sempre deveria estar em primeiro lugar: a união entre eles. E para alegria minha e de Júlio os víamos crescer fortes e muito unidos.

A minha filhinha estava com dois anos quando veio o nosso quinto e último filho; eu fui acometida de uma enfermidade um tanto grave, não tínhamos esperanças que eu chegasse a ter a criança.

Júlio como sempre amando-me muito deu-me a quinta volta do colar na véspera do natal deste ano dizendo-me: 

Quero que sares logo para quando nascer nosso filho darmos uma festa. 

E logo no mês de janeiro nasceu meu filho e eu sarei.



Cresceram os nossos cinco filhos.

Fizemos nossas Bodas de Prata e eu pela primeira vez usei o meu colar de cinco voltas. Na minha vaidade de mulher e mãe nunca vi um colar mais lindo que este: aquela fantasia que me enfeitava e aquele verdadeiro que me rodeava. Os meus dois filhos mais velhos se casaram nesse dia.

Na véspera daquele dia tão bonito Júlio disse-me: 

Gostou dos presentes que demos aos nossos filhos? 

E eu respondi: 

Sim, porém gostaria que desses a cada um deles um pouco daquela linha do colar, que mesmo com o decorrer dos anos ele, jamais se partirá. 

Ao que ele me respondeu: 

Eles arranjarão linhas tão fortes quanto a nossa e farão outros colares.

Agora eu compreendo que estas linhas simbolizadas no colar não são nada mais que união, renúncia e boa vontade em cada um.

Passaram-se trinta anos: o meu colar está dividido, três de meus filhos estão casados, não tenho mais o meu Júlio.



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